quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Ucrânia - O avião II





Bom, estive a aguardar pela saída do relatório oficial da investigação ao MH-17. É impressionante o que se lê na imprensa. Ao ponto por exemplo no Observador,(que é um site onde também participo no espaço de comentários, principalmente quando o assunto foca a Rússia), horas antes de sair o relatório, fazer uma noticia baseado num jornal holandês, que dizia que havia participação russa no abate do avião de acordo com fontes anónimas. Horas antes.

A imprensa tanto nacional como internacional esteve durante todo o tempo desde que ocorreu esta tragédia a apontar os dedos à Rússia. Sempre a Rússia, nunca parando para pensar se haveria mais culpados nesta tragédia. Ao longo dos meses, sempre foi saindo umas notícias, sempre com umas fontes duvidosas para relembrar os leitores quem seriam os culpados da coisa. Só podiam ser os russos. Não houve margem para segundos pensamentos, o culpado estava encontrado.

Eu na altura também quis registar a minha opinião sobre este assunto, tendo criado um post Ucrânia - O avião para poder comparar a minha opinião com o que quer que saísse numa investigação oficial. 

Vou agora comparar o que disse na altura, com os resultados agora da averiguação:

1)

...Se já acho criminoso a Ucrânia ter deixado o seu espaço aberto para aviação civil...

Relatório:

...Management of the airspace above a country is an exclusive right of the sovereign state. From this exclusive right, the Dutch Safety Board also derives a large responsibility borne by the state concerned. For the purpose of this management, the state has the exclusive power to close the airspace (or a part thereof) or restrict its use if there is a reason to consider such a measure...

...In the international system of responsibilities, the sovereign state bears sole responsibility for the safety of the airspace. The fundamental principle of sovereignty can give rise to vulnerability when states are faced with armed conflicts on their territory and in their airspace...

...The statements made by the Ukrainian authorities in which they reported that military aeroplanes had been shot down on 14 and 16 July, and in which they mentioned weapon systems that were able to reach cruising altitude of civil aeroplanes, provided sufficient reason for closing the airspace above the eastern part of Ukraine as a precaution...

...according to the Ukrainian authorities, the shooting down of an Antonov An-26 on 14 July 2014 and that of a Sukhoi Su-25 on 16 July 2014 occurred while these aeroplanes were flying at altitudes beyond the effective range of MANPADS. The weapon systems mentioned by the Ukrainian authorities in relation to the shooting down of these aircraft can pose a risk to civil aeroplanes, because they are capable of reaching their cruising altitude. However, no measures were taken to protect civil aeroplanes against these weapon systems...

2)

...ainda consigo vislumbrar alguns motivos para a Ucrânia querer manter aberto o seu espaço, tais como, poder usar aviões seus nas mesmas rotas, para verificar posição dos separatistas...

Relatório:

... The decision-making processes related to the use of Ukraine’s airspace was dominated by the interests of military aviation...

...During the armed conflict in the eastern part of Ukraine, the initiative for taking measures related to the airspace, based on safety analyses, originated from the military authoritiesThe findings of the Dutch Safety Board, as reported above, mean that it is plausible that decisions related to the airspace were primarily taken from the perspective of the military’s interest, in which a potential risk to civil aviation was not the subject of any explicit consideration.

3)

De que nos serve organizações como a ICAO (International Civil Aviation Organization), a EASA (European Aviation Safety Agency), a FAA (Federal Aviation Administration), que com tantas regras, tantas protecções, tantas verificações de segurança, de que nos vale isto tudo, se quando formos comprar uma viagem para a nossa família para um destino de férias, fazem-nos passar por zonas de conflito onde aviões são abatidos?

Relatório:

... third parties such as ICAO - did not identify potential risks posed by the armed conflict in the eastern part of Ukraine to civil aviation...

...ICAO did not see any reason for questioning Ukraine or offer assistance...

4)

...E também quem não fica bem nesta fotografia, são todas as companhias que por uma questão económica, usaram estas rotas sabendo da falta de segurança das mesmas e que se refugiam na desculpa de que o espaço aéreo estava aberto e daí parecerem querer lavar as mãos...

Relatório:

...As operating carrier, Malaysia Airlines was responsible for the safe operation of flight MH17 and therefore for the choice of the flight route on 17 July 2014. The way in which Malaysia Airlines prepared and operated the flight complied with the applicable regulations. Malaysia Airlines relied on aeronautical information and did not perform any additional risk assessment...

...Given the vulnerability of states facing an armed conflict, operators and other aviation parties cannot take it for granted that the airspace above the conflict zone is safe. They should perform their own risk assessment of the risks involved in overflying conflict areas...

Eu não vou continuar mais, isto dá trabalho e penso que dá para perceber o que quero transmitir.

Primeiro, a maior fatia de responsabilidade recai sobre a Ucrânia. A Ucrânia é responsável pelo o seu espaço aéreo e este deveria estar fechado. Se estivesse fechado esta tragédia não teria acontecido.

O que a Ucrânia demonstrou, foi que os países envolvidos em conflitos, não são de confiança, no que toca a decisões sobre o seu espaço aéreo. As organizações e companhias não se podem basear nas informações fornecidas pelos países em questão.

Este caso é mais grave, porque é um país apoiado por nós, Ocidentais. Ou seja, os países ocidentais deram suporte à Ucrânia e a imprensa também. Mas as investigações devem ser sérias e isentas, e não seria possível fugir muito das regras, da verdade das coisas. Uma investigação deturpada ou viciada, iria atirar a coisa para outros patamares mais graves. Não é só a imprensa histérica que atira opinões cá para fora. Existe neste mundo, pessoas e estados que estão a ver com atenção sobre como estes assuntos são tratados, não é possível deturpar as regras do jogo a "nosso" favor. As regras existem.

Este caso não vai ficar por aqui. Há muito coisa em jogo, como o prestigio de nações, companhias e dinheiro para indemnizações.

Mas uma  coisa é certa, não será pelas notícias que a imprensa coloca que vamos ficar a saber da coisa. A imprensa procura o escândalo, o que seja mais rentável. A imprensa não procura a verdade e nem se dá ao trabalho de a procurar.

Já passaram dois dias após saída do relatório. O que se sabe das conclusões a que se chegou? 

Que era um míssil russo...

E depois?

O facto é que se o espaço aéreo estivesse fechado como deveria estar, nenhum míssil russo, americano, inglês, francês, chinês, conseguiria abater um avião.

Essa é que a verdade. 

Mas vemos isto falado em algum lado? Assim que se começou a perceber onde recai as culpas, deixa de ser notícia...