domingo, 14 de agosto de 2022

Portugal e Gás: O Desespero de Scholz


Scholz está num beco sem saída. 

E é este desespero que o faz sonhar com uma ligação de gás com Portugal. Não há vantagens nenhumas, a solução não é rápida o suficiente e mesmo que fosse, não há fornecedores e mesmo que houvesse não há gás e mesmo que houvesse não há gás a preços russos.

Scholz teve azar e Merkel foi poupada a esta crise. Não tenho dúvidas que a Rússia actuou apenas após a finalização da construção do Nord Stream 2 (Nord Stream 2: A Conclusão Dos Pipelines Para a Europa), que sofreu grandes atrasos devido às várias jogadas americanas para impedir a sua concretização. Mas foi concluído antes de Merkel sair de cena  tendo Merkel resistido a toda a pressão para que o pipeline fosse cancelado. Entretanto Scholz entrou em cena e poucos dias depois tinhamos o últimato russo lançado.

Scholz, que curiosamente é do mesmo partido que Schroeder, que foi um dos grandes impulsionadores destes pipelines directos para a Rússia, não se deve aguentar no cargo. A situação está cada vez mais complicada. A Alemanha é deficitária em energia e ao mesmo tempo é uma grande potência industrial.

A Alemanha para se manter competitiva necessita de alguma variável que permita estar no "jogo".

Os EUA, têm muita energia, a Rússia também, a China não tem, mas esta apesar de ter que importar energia, pode jogar com os salários dos chineses. Os alemães não têm esse luxo. Energia a preços russos, permite lidar com a concorrência. Não tendo este factor, toda a indústria alemã fica em risco.

Mas não tendo energia mesmo sendo a que preço fôr, poderá ser mortal para a economia alemã, com todas as agravantes que dai advirão.

Achei bastante interessante um artigo que saiu hoje no Finantial Times sobre esta questão:

Germany must cut gas use by 20% to avoid winter rationing, regulator says

Germany must cut its gas use by a fifth to avoid a crippling shortage this winter, its top network regulator said, as businesses and households brace themselves for Europe’s biggest energy crisis in a generation...

...Müller said Germany would also need about 10 gigawatts of extra gas supply from other sources to make up for the missing volumes from Russia — largely liquefied natural gas from countries such as the US. That represents about 9 per cent of its current gas consumption...

...Müller also warned that the longer-term cost of ending Germany’s dependence on Russia would be a “very high gas price” that could have big consequences for business.

Some production could move away from Germany because gas has become too expensive,” he said...

...The decline in deliveries has pushed up gas prices, with the European benchmark rising from around €66 per megawatt hour at the start of the year to €206 (as of Friday afternoon). It has also played havoc with Germany’s attempts to fill its gas storage ahead of winter...

...“You need to try to figure out what effect cutting off the gas to certain companies will have on the supply chain for critical products, what the consequences will be for jobs, for production, for value chains,” he said...

...On Saturday, Germany reached the 75 per cent goal two weeks ahead of schedule, as gas saving measures and high prices led to reduced use...

... He warned that even if all tanks were filled they would only have enough gas for about two and a half months if Russia halts supplies altogether — and only provided it is not an unusually cold winter...

...The country has chartered several specialised ships known as floating storage regasification units (FSRUs) that can turn LNG back into gas and feed it into the German pipeline network. Two will go into operation at the start of 2023. It is also building three permanent LNG terminals...

...Yet experts warn that finding enough LNG will be a challenge...

...If it comes to a gas emergency in the winter, Germany’s government has made clear that private households will be protected from a cut-off of supply...


O que o regulador alemão está a dizer, de uma forma suave, é que a situação é catastrófica. O que o regulador diz neste artigo do FT confirma tudo aquilo que já venho a dizer há meses.

A Europa aproxima-se de uma situação crítica energética que ainda  pode evoluir para uma situação de guerra com a Rússia.

Curiosamente o artigo fala sobre os valores de gás no início do ano (66€) e os valores de 6ª feira passada (206 €). Mas não diz o mais relevante. O valor de 66€ já é sensivelmente 3 vezes mais que a média dos últimos anos que andava sensivelmente nos 20€. 6ª feira passada estava acima dos 200€ o que significa valores 10 vezes mais que no ano passado e anteriores!

Isto são valores incomportáveis para a economia europeia. Os políticos europeus estão a tentar esconder a verdadeira factura que os contribuintes mais tarde ou mais cedo vão pagar. Mas os valores são de tal ordem, que a coisa vai rebentar. E não deverá demorar muito.


Este gráfico coloquei num post anterior em Março ainda antes de estalar a guerra. (Guerras Energéticas: O Preço Das Opções Europeias II). E já tinha chamado a atenção para esta questão em Outubro do ano passado (Guerras Energéticas: O Preço Das Opções Europeias)

Scholz está encostado à parede. E se o motor da Europa está encostado à parede, todos nós vamos acabar por ficar na mesma situação.

E enquanto a Alemanha agonia, a Arábia Saudita...

Saudi Aramco profit surges 90% in second quarter amid energy price boom

Saudi oil giant Aramco reported a stunning 90% surge in second quarter net income and record half year results on Sunday, as high oil prices continue to drive historic windfalls for “Big Oil.” 

...Aramco said half year net income soared to $87.9 billion, easily outpacing the largest listed oil majors, including Exxonmobil, Chevron and BP and other “Big Oil” companies...

...The blowout results are also a major windfall for the Saudi Arabian government, which relies heavily on its Aramco dividend to fund government expenditure. The Kingdom reported a $21 billion budget surplus in the second quarter...

E quem é amigo do príncipe saudita, quem é?

Biden? O que foi lá para pedir aumentos de produção de forma a baixar preços e lucros?


Não. As amizades agora são outras. Os sauditas agora estão empenhados na OPEC+.

E o "+" da OPEC é o quê?


É a Rússia.

Como as coisas mudaram desde que os sauditas resolveram fazer um braço de ferro com os russos. Aprendido a lição, descobrem agora que lucram muito mais estando do lado deles do que contra eles.

Sobre este tópico, convém relembrar o que disse nos seguintes posts:


[América: O Declínio III]

E os sauditas ficam por aqui? Não, basta ver as notícias que sairam hoje.

Saudi prince made $500mn Russia bet as Ukraine war started



Kingdom Holding pumped investment into Gazprom, Rosneft and Lukoil as west pushed for sanctions.

Kingdom Holding, one of Saudi Arabia’s highest-profile investors, poured hundreds of millions of dollars into Russian energy firms shortly before and after the invasion of Ukraine this year, the group disclosed in a filing on Sunday...
E além disto, os sauditas querem também integrar o grupo dos BRICS, algo que terei que falar em breve.

Scholz está metido num molho de bróculos? Está.

E nós também.

Sem comentários:

Enviar um comentário